sábado, 30 de dezembro de 2017

Balanço de 2017

Como assim, já passou mais um ano? Assim tão depressa? Mas se parece que foi ontem que começou...

Foi um ano atribulado, um ano de descobertas, de surpresas, de esperanças, de ilusões, de possibilidades. Foi o ano em que pude voltar à Feira do Livro de Lisboa e conhecer pessoalmente ou rever algumas das tantas pessoas fantásticas que este mundo maravilhoso me deu a conhecer. Foi o ano de participar na Comic Con e de, inesperadamente, conhecer a Claire North, uma das minhas autoras favoritas (que até está algures na lista ali em baixo). Infelizmente, não pude conhecer A minha autora favorita (que, para quem ainda não sabe, é a Anne Bishop), mas, hélas, não se pode ter tudo... Foi o ano dos possíveis e do que não pôde acontecer, das muitas páginas lidas e das que ficaram por ler, do possível, do impossível e do... talvez para o ano?

E por falar em páginas lidas, a contagem deste ano também não correu mal. Foi um total de 239 livros lidos (ok, ok, alguns foram pequeninos...) apesar do tempo que insiste em fugir. E destes, foram tantas as memórias boas que ficaram, tantas as novas personagens que me fascinaram, que me cativaram, que encontraram um lugarzinho no meu coração para se aninharem (e algumas para o partirem aos bocadinhos...). Foi um ano bom, em termos de leitura. E sabem o que é ainda mais maravilhoso? É que há sempre mais bons livros para ler, mais personagens maravilhosas para conhecer... há sempre mais vida no mundo dos livros. E eles esperam por nós, mesmo quando nos atrasamos. Eles estão sempre lá. 

Mas vamos aos melhores do ano, sim? E devo começar por dizer que não foi uma escolha fácil. Houve muito de apaixonante nas minhas leituras do ano e podia facilmente acrescentar mais alguns a esta lista de favoritos. Mas não quero que se cansem de mim. Por isso, ficam os dez do costume... que foram estes:


Não tenho a certeza de conseguir explicar o que foi que me marcou tanto neste livro. Talvez a complexidade do mundo (mundos?), talvez a complexidade (pois, tenho mesmo de repetir esta palavra) das personagens, talvez até a teia intrincada de elementos que se conjugam em cada parte do livro. Ou talvez tudo isto associado a um ritmo narrativo a que é difícil resistir e a uma intensidade emocional de que de facto não estava à espera. Sei que fiquei fascinada desde o início e que não parei de me maravilhar até ao fim. E, por isso, foi esta a minha leitura preferida de 2017.


Foi provavelmente a descoberta do ano. Fiquei fascinada com o protagonista logo ao primeiro livro, e também com a escrita do autor. (Sabem aqueles livros em que só apetece apontar citações? Bem, quase que o anotava todo.) Mas este último volume atinge um pico de emoção e de intensidade e de surpresas e de... bem... de muitas surpresas... e há algo de estranhamente maravilhoso em apaixonarmo-nos por um livro que nos parte o coração. Que foi precisamente o que este livro me fez.


Bem, não é propriamente uma novidade nas minhas listas de favoritos. Mas, voltando às coisas estranhamente maravilhosas, também é algo de delicioso quando o segundo livro que lemos de um autor nos encanta tanto como o primeiro e foi precisamente isso que aconteceu aqui. A história deste livro é, em medidas iguais, intrigante e complexa e a forma como estas duas facetas se conjugam dá forma a algo de muito viciante. E, claro, a própria protagonista é, toda ela, um grande núcleo de fascínio, o que torna toda a leitura ainda mais impressionante.


Muito diferente de O Quarto de Jack, mas com a mesma emotividade, com a mesma capacidade de fascinar e com um contraste avassalador entre inocência e manipulação, este é um livro capaz de questionar tudo e de surpreender a cada resposta. Escrito num estilo muito directo, mas com um enredo em que há complexidades escondidas até no mais simples dos actos, este é o tipo de livro que facilmente fascina... e que marca até nas pequenas coisas.


A inocência da infância e a crueldade da vida, provavelmente o mais inevitável de todos os contrastes, numa história contada com as medidas certas de ternura e de realismo. Maravilhosamente escrito, enternecedor em todos os momentos e com uma fluidez a que é difícil resistir, um livro capaz de prender da primeira à última página, ao mesmo tempo que nos vai deixando de coração apertado.


Personagens fortes, uma história intensa e um certo laivo de ambiguidade moral a pautar um percurso onde o que está certo é uma fina terra de ninguém entre os caminhos de vencedores e vencidos. Fiquei fascinada com Arin e, ao mesmo tempo, com a forma como, neste mundo complexo, todos os actos podem ser de heroísmo ou de crueldade, consoante o lado que os contempla. Um início de série poderoso e uma história que quero muito continuar a ler.


Estão a ver aquele comentário ali atrás sobre livros que dão vontade de tomar nota das citações? Bem, este é outro do mesmo género, em que, se começasse, provavelmente tinha apontado o livro quase todo. Mas há mais para além da escrita maravilhosa do autor. Há um protagonista forte (e, contudo, vulnerável), uma história que percorrer os tempos para dar forma a uma verdade intemporal e um caminho de emoções e de descobertas que ficam na memória bem depois de terminada a leitura.


Há algo de fascinante nos livros que nos comovem, nos que conseguem fazer-nos sentir com as personagens e viver por um bocadinho a vida delas. E é curioso que, às vezes, basta uma história simples para que isso aconteça. À primeira vista, este não é um livro particularmente complexo. Mas a forma como trata os grandes dilemas da vida das personagens, construindo-as também como muito mais do que um conjunto de características estáticas, dá toda uma outra vida a esta história, que, repleta de momentos comoventes, acaba por inevitavelmente deixar uma marca no coração de quem a lê.


Bem, Arlidge é Arlidge, e não é novidade para ninguém que é um dos meus autores favoritos neste género. Mas a série tem vindo a ganhar um impacto emocional cada vez mais forte e, ao pôr a protagonista, já de si tão complexa e cheia de sombras, no mais terrível dos cenários e mais vulnerável que nunca, o autor constrói o cenário perfeito para uma leitura alucinante. Intenso, viciante, sombrio e fascinante, também este volume corresponde inteiramente às expectativas. E, por isso, não podia deixar de estar também nesta lista.


E o último da lista foi uma das surpresas do ano. Não é novidade que eu gosto deste tipo de leituras, mas não estava à espera da intensidade furiosa que define o ritmo deste livro. Cheio de segredos, cheio de surpresas, com uma forma um tanto ou quanto retorcida (mas deliciosamente fascinante) de ir desvendando os demónios das personagens e um crescendo de intensidade simplesmente viciante, este é o livro perfeito para quem gosta dos seus policiais sinistros - e com um toque de horror.

Segue-se 2018. E espero que (muitas) mais leituras. Não vou fazer promessas, não vou fazer planos. Espero só ler o máximo possível e, se possível, pôr em dia as muitas séries que adoro e que estão um bocadinho (ou... bastante) atrasadas. O resto... bem. Que sejam boas leituras. Isso basta-me. 

E para o ano em geral? Que seja sempre melhor que o que já passou, que traga novos sonhos, melhores realidades, todas as possibilidades que ainda ficaram por concretizar. E magia, nos livros como na vida, para que o mundo fique sempre um bocadinho melhor.

Bom ano, boas leituras... e até 2018! ;)

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Limões na Madrugada (Carla M. Soares)

Afastada da vida que construiu na Argentina e de volta ao Porto para desvendar os segredos de um ramo familiar de que mal se lembra, Adriana dá por si com um grande mistério nas mãos. Ficaram-lhe de herança alguns registos com pouco significado e três quadros perturbadores em que não consegue deixar de pensar. De volta à casa da família, Adriana começa a sentir-lhe os fantasmas - fantasmas que parecem colar-se mais a ela a cada passo que dá. Mas nem o desvendar do passado lhe poderá trazer a paz que procura. Pois todas as famílias têm segredos... mas os da sua são particularmente sombrios.
Sendo, como é, uma história num registo um pouco diferente do habitual na autora, uma das primeiras coisas a sobressair neste livro é a forma como diferença e familiaridade parecem conjugar-se num equilíbrio delicado. O livro é diferente - menos factos históricos, mais jornada pessoal - mas a voz continua a ser a mesma que já se afirmou nos livros anteriores. Uma voz serena, natural, que traça com a mesma mestria a intensidade dos acontecimentos e a introspecção que move os dilemas interiores da personagem. Uma voz que, contendo algo de poesia, nunca se perde, porém, em devaneios, mantendo sempre firme a corrente que prende a escrita à história que vem contar.
Mas falemos da história e da forma como esta é contada. Oscilando entre diferentes pontos do tempo, mas sempre centrada na vida e nos pensamentos (e, já agora, nas emoções) de Adriana, permite vislumbrar diferentes modos de vida e de pensamento, moldados em parte pela época em que um certo acontecimento se dá, mas também pelas repercussões desse tempo nas gerações seguintes. E, ao mesmo tempo, traça os contornos de um segredo intemporal, pois ainda hoje é possível encontrar na realidade tantos (demasiados) pontos em comum com a história dos familiares de Adriana.
É talvez esta a grande beleza da história - a capacidade de traçar as linhas de um enredo sombrio sem nunca perder de vista o que existe para lá das sombras. A história vai mais além que o segredo sinistro dos Brancos. Vive também do amor que se descobre, das relações que perduram, da capacidade de olhar para o passado e aceitar o papel que nele se teve... ou não. No fim, fica a impressão de ter percorrido um longo caminho - e, curiosamente, embora as páginas pareçam voar, tudo parece ter precisamente a medida adequada. E a história, essa, fica gravada na memória, tal como as personagens imperfeitas (muito humanamente imperfeitas, aliás) que a povoam.
Intrigante, intenso e curiosamente viciante, este é, pois, um livro que, embora num registo ligeiramente diferente, confirma a solidez da voz da autora. E, com as suas personagens peculiares, o enredo em que os grandes dramas se propagam para lá do fio do pensamento do seu tempo e as grandes revelações assustadoramente realistas, uma história que fica na memória muito depois de lida a palavra fim. Muito, muito bom.

Título: Limões na Madrugada
Autora: Carla M. Soares
Origem: Recebido para crítica

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Frei Luís de Sousa (Almeida Garrett)

O casamento de D. Manuel de Sousa Coutinho e de Dona Madalena de Vilhena pode ter sido por amor e trazido à vida a luz dos olhos de ambos - mas há presságios e agouros sombrios que se recusam a desaparecer. O primeiro marido de Madalena terá morrido em Alcácer-Quibir, mas há ainda quem duvide desse facto. E, quando um acto de resistência ao domínio filipino leva Madalena a regressar a casa do seu primeiro marido, os presságios começam lentamente a ganhar forma... e a chegada de um misterioso romeiro traz consigo uma mensagem capaz de lançar por terra a paz dos últimos anos. Quem é o romeiro? Ninguém? Muito mais que isso, na verdade...
Provavelmente, esta não será uma história nova para muitos leitores. Afinal, ficámos a conhecê-la na escola. Mas uma das coisas mais interessantes de voltar a estes livros que dissecámos até à exaustão é que, ao lê-lo simplesmente pelo prazer de ler (e também, talvez, com uma mente mais adulta) se fica com uma perspectiva muito diferente do livro. Sobressai mais o conteúdo, menos a forma. E as peculiaridades tão detalhadamente dissecadas vêem-se agora como um todo mais harmonioso.
Voltar a esta peça é recordar também o contexto histórico em que tudo decorre, e é interessante notar como toda a informação pertinente está presente nos diálogos das personagens. Além disso, e apesar dos longos diálogos (e ocasionais monólogos) das personagens, é também curioso o facto de nunca o texto se tornar aborrecido. Aliás, muito pelo contrário, já que o constante dramatismo, que inclui até uns quantos excessos, confere a tudo uma estranha intensidade que torna quase irresistível o exercício de imaginar como será ver esta peça levada a palco.
Nem tudo é claro. Nem tudo encontra respostas. O drama foca-se principalmente nos protagonistas e, por isso, há personagens igualmente fascinantes que passam inevitavelmente para segundo plano. Mas, tal como na vida ficam mistérios por desvendar, também aqui faz um certo sentido que o resto fique para trás quando tudo culmina de uma forma tão dramática. E os restantes... bem, os restantes serviram o seu objectivo.
No fim, fica a sensação de um belíssimo regresso, visto agora com menos regras e com um olhar mais ponderado. E a impressão de que, tal como o que se aprendeu continua presente, também a nova perspectiva permite ver esta peça como aquilo que é: um drama por vezes bizarro, por vezes melodramático, mas sempre intemporal. 

Título: Frei Luís de Sousa
Autor: Almeida Garrett
Origem: Aquisição pessoal

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Nada é Impossível para a Patrulha Pata! (Nickelodeon)

Com espírito de equipa, amizade verdadeira e um conjunto de capacidades que se complementam mutuamente, nada é impossível para a Patrulha Pata! E nada como começar a descobrir estas aventuras caninas desde muito cedo. Este livro contém dez histórias muito, muito simples, acompanhadas de pequenos exercícios, para despertar nos mais pequenos o gosto pela leitura e por uma boa história.
Se há alguns livros infantis que facilmente enchem as medidas a leitores mais velhos e até mesmo a adultos, outros há que se cingem mais ao seu público-alvo. É o caso deste livro. Com histórias que se resumem a poucas linhas e em que as imagens acabam por ser mais cativantes que o texto em si, este é um livro que parece ter sido pensado para quem está mesmo a começar a ler - ou então para ser lido aos muito pequenos. Assim sendo, não é propriamente aquele tipo de livro que vá surpreender um leitor mais experiente (e, mais uma vez, muito menos um adulto), mas não deixa, ainda assim, de ficar a impressão de que pode ser uma forma simples e divertida de ensinar uma criança a ler ou de a cativar com uma história curta, simples, mas interessante.
Claro que também ajuda o facto de ser um livro da Patrulha Pata, pois quem seguir os desenhos animados terá certamente curiosidade em descobrir mais histórias das suas personagens preferidas. Mas, mais uma vez, e apesar da tal simplicidade extrema, há aqui um outro aspecto positivo: é que não importa se se conhecem ou não as personagens. O essencial está no livro.
Centrado no público a que se destina e bastante eficaz na forma como consegue, em poucas linhas, contar uma história muito simples, mas cativante, eis, pois, um livro para pôr os mais pequenos a ler desde muito cedo. Simples e bonito, uma boa forma de descobrir a leitura. 

Título: Nada é Impossível para a Patrulha Pata!
Autor: Nickelodeon
Origem: Recebido para crítica

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

As Últimas Linhas Destas Mãos (Susana Amaro Velho)

Há muito que a relação de Teresa e dos irmãos com a mãe deixara de ser funcional, mas a sua morte súbita não deixa de ser um choque, principalmente porque, antes de se atirar ao mar, Alice deixou para trás um vasto conjunto de cartas de amor. Inicialmente, Teresa presume que o destinatário é o pai, mas há algo de estranho no contraste entre aquelas cartas fervorosas e o desamor que acabou por culminar num divórcio já demasiado tardio. A única coisa clara é que o amor de Alice fora tão intenso quanto destrutivo. E, à medida que vai lendo e novos segredos vêm à tona, Teresa começa a descobrir que, por detrás das palavras, está escondida uma verdade ainda mais dolorosa. Uma verdade que abalará a vida que julga conhecer.
Tendo como fio condutor as cartas de Alice, mas oscilando entre diferentes pontos de vista, é no mistério em torno das cartas e do seu destinatário que se encontra o grande ponto forte deste livro. Cedo se torna óbvio que o que Teresa julga saber sobre toda a situação não é verdade, mas as explicações, essas, não são assim tão fáceis de encontrar. E assim, o caminho vai-se traçando entre grandes mágoas e pequenas obsessões, que dão a conhecer diferentes facetas das várias personagens e culminam numa revelação que, não sendo completamente inesperada, confere, ainda assim, uma nova perspectiva a tudo o resto.
Não é propriamente uma leitura compulsiva, já que, quer nas cartas de Alice, quer no percurso de todas as outras personagens, há uma grande componente introspectiva. Além disso, as relações entre todos estão muito longe de ser fáceis. Ninguém na família é uma personagem simples e, em muitos aspectos, não são sequer do tipo que desperta empatia. Ainda assim, a intensidade das emoções envolvidas e a necessidade de descobrir a verdade por trás de um enigma que tanto destruiu alimentam a necessidade de continuar a ler - mesmo quando é o lado mais desagradável das personagens aquele que mais sobressai.
Ainda um outro aspecto curioso surge do contraste entre os aparentes excessos de dramatismo das cartas de Alice e a estranha naturalidade com que toda a disfuncionalidade é encarada. Há mágoas profundas entre as personagens e marcas de um passado que não está assim tão distante. Ainda assim, os confrontos não são muitos e a forma como os ressentimentos se vão manifestando - mais em pensamento que em acção - acaba por parecer estranhamente realista.
E assim, a impressão que fica é a de uma leitura pausada, contemplativa, tão ambígua como as personagens que a povoam. Mas também estranhamente cativante na sua fusão de drama pessoal e de um mistério que se prolonga por demasiados anos. Envolvente, introspectiva e com alguns momentos verdadeiramente surpreendentes, uma boa leitura.

Autora: Susana Amaro Velho
Origem: Recebido para crítica

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

A Rapariga que Salvou o Natal (Matt Haig)

Chegou a véspera de Natal, mas algo de errado se passa na Elfolândia. A esperança que torna a magia possível parece estar a diminuir e, ao mesmo tempo, a paz para lá das montanhas também parece vacilar. E, quando um ataque dos trols impede o Pai Natal de realizar os desejos das crianças naquele ano, a esperança definha ainda um pouco mais. É preciso fazer alguma coisa, mas, para salvar o Natal, o Pai Natal precisa da ajuda da primeira criança que acreditou. Só que a vida de Amélia piorou consideravelmente desde essa altura e, para salvar o Natal, é preciso primeiro salvar Amélia... e fazer com que ela volte a acreditar.
Uma das coisas mais encantadoras neste livro natalício é que, embora seja uma história escrita ao pensar nos mais jovens, consegue encantar da mesma forma os leitores adultos. Sim, é verdade que a inocência da história pode, às vezes, fazer com que pareça que tudo se resolve de forma demasiado simples... bem, mas a magia é isso, não é? E há algo de mágico em voltar a entrar no estado de espírito inocente de uma criança que ainda acredita que a magia pode resolver tudo, trazer todos os tipos de felicidade e tornar possíveis os impossíveis da vida.
No fundo, é isto que mais marca neste livro: a mensagem positiva desta aventura. Mas desengane-se quem pensa que é só da mensagem que vive a alma deste livro. Não, a história de Amélia e do Pai Natal está cheia de perigos, de aventuras, de peripécias divertidas e até de alguns pequenos momentos comoventes. É fácil entrar no espírito ao longo do livro e nutrir sentimentos por estas tão estranhas, mas tão naturalmente construídas, personagens.
E depois há a forma que, não sendo talvez o mais importante, acaba por maximizar o impacto de tudo o resto. As ilustrações dão uma nova vida às personagens que, já de si, têm vida que chega e sobra. E a escrita de Matt Haig, com os seus sempre fascinantes rasgos de mestria e frases memoráveis, torna tudo ainda mais mágico. 
Ah, e há mais uma questão. É verdade que ficaram umas quantas perguntas sem resposta - mas isso deve-se também ao facto de haver um livro anterior a este e outro a seguir. Por isso, mais que a sensação de curiosidade insatisfeita - até porque a forma como tudo termina é bastante adequada - fica a vontade de ler os outros livros para descobrir o resto.
Tudo somado, fica a impressão de uma aventura enternecedora e cativante, em que personagens sobejamente conhecidas ganham uma nova vida. Inocente quanto baste e com uma história tão deliciosa como a mensagem que contém, uma bela leitura natalícia... ou para qualquer outra época do ano. Afinal, o Natal é mais do que uma data, não é?

Título: A Rapariga que Salvou o Natal
Autor: Matt Haig
Origem: Recebido para crítica

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Carta ao Pai Natal



Querido Pai Natal...

Eu sei, eu sei... Já não tenho idade para estas coisas. Mas sabes? Acho que me compreendes se disser que a vida precisa de uma certa magia para fazer sentido, e que há uma espécie de magia que nós, que nos perdemos na imaginação, conhecemos particularmente bem.
Têm sido tempos estranhos, tanto de grandes esperanças como de sombras e de medos. E gostava de te pedir que nos trouxesses um mundo melhor, mas acho que, se isso estivesse ao teu alcance, já o terias feito. Afinal, o mundo é tão grande e os obstáculos tantos e tão diferentes...
Mas sabes? Eu conheço um tipo de magia que, embora aparentemente pequena, é capaz de grandes coisas. Pode salvar-nos quando a vida parece um abismo sem fim. Pode abrir-nos as portas de mil vidas quando precisamos de nos afastar da nossa por um bocadinho. Pode apresentar-nos pessoas melhores e, com isso, fazer-nos querer ser melhores também. Pelo menos, foi isso que aconteceu comigo.
E sabes o que é ainda mais mágico? É que nem todas essas pessoas melhores são imaginárias ou de um passado que não volta. A mim, esta encantadora magia trouxe-me amigos para a vida, pessoas com quem posso partilhar os meus fascínios e pequenas obsessões, que posso contagiar com o entusiasmo que uma história ou um herói - ou até mesmo um vilão! - despertou em mim.
Pois é, de certeza que já conheces o tipo de magia de que estou a falar: a magia dos livros. E é por isso que quero pedir-te que espalhes esta magia por todos aqueles que, como eu, partilham deste encanto pelas histórias. Traz-nos novas descobertas, romances apaixonantes, livros com que podemos aprender e personagens que possamos amar. Traz-nos os livros que tornam melhores os nossos dias, os que nos comovem, os que nos fazem sorrir, os que nos salvam. Traz-nos esta magia na sua forma mais pura, para que possamos sonhar o ano inteiro.
E deixa-nos, a todos os que não sabemos viver sem eles, mesmo que a pilha de livros para ler seja sempre demasiado grande para medir, um novo mundo de histórias para nos encantar a cada dia. Livros para todos os que os amam, por favor. (E, se quiseres deixar também um ou dois no meu sapatinho, nunca te direi que não).
Que seja um Natal mágico para todos. E também para ti, Pai Natal, que existes na imaginação do mundo.
Feliz Natal.
Carla


Um Feliz Natal para todos os que por aqui passam, com muita magia, alegria e todos os sonhos do mundo.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

O Livro do Natal

Natal. Tempo de luzes, de doces, de passar tempo com a família e os amigos, de almoços, jantares e festas natalícias em geral. Tempo de decorações coloridas, de recordações mais ou menos bizarras e de uma certa nostalgia dos Natais passados. Porque o Natal pode ser quando o homem quiser - e também pode ser como se quiser. Mas há sempre memórias que se constroem, planos que é preciso fazer, coisas que não podemos esquecer. E para manter tudo isso na ordem, desde as tarefas às recordações, eis este livro.
Natalício - é precisamente isso que este livro é. E, sim, é óbvio. Basta olhar para o título, para a capa, para a abundância de verdes e vermelhos que quase salta das páginas. Mas é mais que simplesmente o aspecto visual. Todo o livro é construído em torno do Natal e, sendo acima de tudo um livro para planear e recordar Natais, transborda ele mesmo do espírito da época, não só no aspecto geral, mas também nas pequenas coisas que folheá-lo traz à memória.
Não é um guia, nem um conjunto de informações e dicas sobre a época. Não. Essas coisas, cabe ao leitor (que, de certa forma, se torna também um pouco autor) registá-las. O que este livro proporciona é precisamente um espaço para tomar notas e guardar recordações sobre as diferentes facetas da época natalícia. Presentes, decorações, receitas, tradições, memórias. Há espaço para tudo. E, embora (ainda) não o tenha preenchido, bastou-me percorrer estas páginas para me trazer ao pensamento as coisas do meu Natal. O que, parece-me, acaba por ser precisamente o objectivo! Proporcionar um meio para organizar as coisas que tornam nosso o nosso Natal.
Mas nem tudo fica nas mãos do leitor, não, embora o muito que tem de pessoal para explorar seja da exclusiva responsabilidade da pessoa que preencherá o livro. Há pequenas informações complementares que vão surgindo ao longo do livro sobre as diferentes tradições do mundo, que acabam por reforçar ainda um pouco mais o já tão presente espírito natalício. Além, é claro, de realçar uma outra ideia muito presente neste invulgar e delicioso livro: a ideia de que não há uma única forma universal de celebrar o Natal, mas antes uma forma certa para cada pessoa. 
É este o tempo das boas memórias - e também das correrias, das tarefas que nunca mais acabam, das mil e uma coisas que não podemos esquecer. Para ajudar - e, acima de tudo, para lembrar o que realmente importa nesta época, eis este Livro do Natal. Bonito, colorido, útil - e, à sua maneira, um tanto ou quanto enternecedor. Porque, principalmente, importa criar e guardar memórias. E, para isso, não se podia pedir melhor auxiliar. Recomendo. 

Título: O Livro do Natal
Origem: Recebido para crítica

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

O Sol Também é Uma Estrela (Nicola Yoon)

Natasha está desesperada. Por causa de um erro absurdo do pai, sabe que nessa noite será deportada para a Jamaica e, por mais que pense, não consegue encontrar uma forma de resolver a situação. Mas isso não a vai impedir de tentar até ao fim. E é em plena tentativa que o seu caminho se cruza com o de Daniel, o rapaz coreano-americano que vai a caminho da entrevista que fará do seu futuro aquilo que os pais querem para ele. Daniel não sabe bem o que quer da vida, mas uma coisa é certa. Desde o momento em que vê Natasha pela primeira vez, ele sabe que estão destinados um ao outro. Demasiadas coincidências juntaram-nos naquele lugar. Não pode ser só um acaso, pois não? Mas Natasha sabe que o seu futuro não é ali e não quer apaixonar-se. E Daniel, por mais persistente que seja, talvez não seja capaz de romper essa barreira intransponível.
Contado em grande parte pela voz dos protagonistas - mas com alguns interessantes interlúdios para dar lugar à história de algumas personagens mais discretas, mas bastante relevantes - este é um livro que marca, acima de tudo, pelo impacto emocional que vai despertando ao longo de toda a história. Basta a situação de Natasha para despertar empatia imediata, é certo. Mas cada momento, venha ele das grandes esperanças e perdas ou das pequenas partilhas e descobertas especiais, deixa uma marca no coração. E assim, aos poucos, Natasha e Daniel vão-se tornando personagens queridas, com a força das convicções e as tão claras vulnerabilidades e aquela estranha mistura de mágoa e de inocência que abre caminho a uma idade adulta onde as consequências serão sempre mais graves. 
Também bastante marcante é que, se olharmos para a linha geral do enredo, a base parece ser muito simples: a história de um primeiro amor. Mas há tanto de único nesta história e tantas pequenas complexidades subjacentes - desde as questões raciais aos arrependimentos pessoais, passando pelas barreiras burocráticas e a descoberta de que nem tudo tem explicação e muito menos solução - que, no fim do caminho, a imagem que fica é a de muito mais do que uma simples história de amor. Claro que a história é, acima de tudo, a de Natasha e Daniel, mas há todo um mundo à volta. E se, desse mundo, ficam algumas perguntas sem reposta, isso é apenas adequado, pois a vida também não dá todas as respostas.
Há ainda um outro ponto a realçar: a estrutura. Construída num sistema de capítulos curtos em que o ponto de vista vai alterando entre os dois protagonistas (e, ocasionalmente, uma ou outra personagem secundária) a história rapidamente ganha um ritmo intenso. Primeiro, porque a forma como tudo evolui facilmente se torna viciante, sendo quase irresistível a vontade de ler mais um bocadinho - e outro e outro - para saber o que acontece a seguir. Mas também porque a própria estrutura do livro potencia este efeito, com a sua escrita simples e os capítulos breves, maximizando a forma como cada momento se repercute nas personagens e, de certa forma, passando um pouco desse impacto para o leitor. 
Somadas as partes, fica a ideia de uma história aparentemente simples, mas onde a magia inocente da descoberta do primeiro amor serve também de pano de fundo a um caminho onde as dificuldades da vida nunca deixam de estar presentes. Intenso, viciante e comovente nos momentos certos, um livro para guardar na memória bem depois de terminada a leitura. E que recomendo, naturalmente.

Autora: Nicola Yoon
Origem: Recebido para crítica

Para mais informações sobre o livro O Sol Também é Uma Estrela, clique aqui.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Escape Book (Iván Tapia)

Candela Fuertes é uma jornalista empenhada que nunca larga um caso - principalmente quando estão em jogo manobras financeiras que podem arruinar a vida de milhões. Mas a sua busca de provas contra Anastás Vecha deixou-a numa situação de vida ou morte. Fechada no Dédalo, o elaborado sistema de segurança do magnata, Candela tem sessenta minutos para resolver os enigmas e encontrar o que procura. Caso contrário, não sairá viva daquele labirinto.
Transpondo para livro o conceito por trás do fenómeno das escape rooms, este é um livro que, mais que pela história em si, cativa pela forma interactiva e desafiadora com que propõe ao leitor desvendar cada enigma para passar à sala seguinte. É como se, ao decifrar cada enigma e ao saltar para o episódio seguinte, fosse possível acompanhar a provação de Candela, de dificuldade em dificuldade até à derradeira e inesperada conclusão.
Claro que, ao centrar o livro nos enigmas, o enredo propriamente dito acaba por ficar para segundo plano. Tudo é contado de forma muito sucinta, realçando principalmente a situação desesperada da protagonista e o sentido de missão que a levou até lá. Há, ainda assim, muito de intrigante neste percurso e várias reviravoltas surpreendentes, abrindo caminho, passo a passo, palmo a palmo (como diria a protagonista) a um final que, embora culminando com a resolução do último enigma, deixa, ainda assim, em aberto várias possibilidades interessantes.
Claro que ficam perguntas sem resposta, não só pela forma como tudo termina, mas também porque, ao isolar a protagonista no Dédalo, o contexto de toda a situação acaba também por ficar, em grande parte, do lado de fora. Ainda assim, este é um efeito quase inevitável, se tivermos em conta que o objectivo é acompanhar (e, de certa forma, orientar) a protagonista na sua fuga. Por mais curiosidade que os restantes elementos possam despertar, não deixam de ser aspectos secundários do livro.
A impressão que fica é, portanto, a de uma aventura em que os desafios e complexidades são partilhados entre protagonista e leitor. Intrigante e surpreendente, um belo desafio mental - acompanhado de uma boa história. Gostei. 

Título: Escape Book
Autor: Iván Tapia
Origem: Recebido para crítica

domingo, 17 de dezembro de 2017

The Dark Sea War Chronicles - Mission in the Dark (Bruno Martins Soares)

A guerra está longe de terminar e, à medida que os confrontos se intensificam, novas forças decidem tomar partido. Neste cenário, a informação é mais importante que nunca e nada está acima da missão - nem mesmo as vidas daqueles que a terão de levar a cabo. Byllard Iddo está bem ciente disto quando aceita ocupar o comando da Arrabat e de uma missão tão cheia de segredos como o inimigo que pretendem fragilizar. Mas, em tempo de guerra, tudo muda num segundo, e é preciso prever todas as possibilidades ou tudo será em vão. Pois a missão pode ser quase suicida - mas a informação que procuram continua a ser crucial para o desfecho da guerra.
Dando continuidade à narrativa iniciada em Fighting the Silent, este segundo livro partilha de todas as características cativantes do volume anterior, elevando-as, além disso, a um nível superior de intensidade. Se o primeiro volume já era viciante, este é quase impossível de largar. Se a acção e as grandes batalhas eram um elemento fundamental, aqui tornam-se na força que tudo move. E, se já havia crueldade em abundância no caminho das personagens... bem, digamos só que o caminho não se torna mais fácil.
Não é preciso muito mais do que isto para reforçar a ideia de que este livro está mais que a altura do anterior. Mas há, ainda assim, mais uns quantos aspectos que importa realçar. Primeiro, o ritmo sempre intenso da escrita, que consegue descrever com a mesma naturalidade grandes e complexas batalhas e pequenos (mas muito marcantes) momentos de vulnerabilidade pessoal. Depois, o delicado e fascinante equilíbrio nas relações entre as várias personagens, que, todas elas bastante marcantes nas suas forças e fragilidades, criam um núcleo ainda mais impressionante se consideradas em conjunto. E, por fim, a fluidez de uma narrativa onde há espaço para emotividade e humor, mesmo quando tudo à volta é caos e conflito.
E depois há Byl, claro, que está longe de ser apenas um comandante excepcionalmente competente (embora também o seja, naturalmente). Há um passado distante que deixou marcas, um passado recente cujas maiores consequências ainda estão por revelar, mas que já deixou também as suas cicatrizes, e um percurso de afirmação gradual que se manifesta não só na hierarquia e no respeito dos outros, mas também na forma como Byl se vê se a si mesmo. Também este crescimento, como que marcado ao ritmo da guerra, torna tudo mais impressionante, maximizando em particular o impacto dos últimos momentos do livro. (Sim, porque se pensam que o autor só é cruel com as personagens, esperem para ver como este livro termina...)
Terminada a viagem - ou, bem, esta parte da viagem - fica a impressão de mais uma leitura viciante, surpreendente e marcante em todos os aspectos... bem como uma vontade irresistível de deitar as mãos ao próximo o mais cedo possível. Intenso, impressionante e cheio de grandes momentos, um segundo volume a não perder. Brilhante.

Título: The Dark Sea War Chronicles - Mission in the Dark
Autor: Bruno Martins Soares
Origem: Recebido para crítica

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

Private: Paris (James Patterson e Mark Sullivan)

Jack Morgan está de visita a Paris para ver como correm as coisas com a sua empresa. Longe está ele de imaginar que se verá envolvido numa série de situações delicadas. Primeiro, um dos seus principais clientes liga-lhe a pedir que encontre a neta, da qual pouco sabe há bastante tempo, mas que acaba de lhe ligar a dizer que está metida em sarilhos. E depois o que começa por ser um conjunto de misteriosos graffiti ganha um novo significado quando as grandes figuras de França começam a aparecer mortas de uma forma altamente simbólica. Todos os recursos da Private Paris serão necessários para desvendar o mistério, pois a tensão que se vive na cidade é imensa e basta a mais ínfima faísca para pegar fogo a tudo.
Já é característico desta série que o enredo se divida entre vários casos. Mas é provavelmente neste livro que as várias partes se conjugam de forma mais coesa. O caso de Kim Kopchinski pode ter muito pouco a ver com os misteriosos actos do grupo AB-16, mas ambos os casos parecem entrelaçar-se com fluidez no ritmo a que a narrativa avança. Além disso, a situação de Jack enquanto estrangeiro no país torna a sua intervenção em ambos os casos mais delicada, o que faz com que tudo progrida com uma muito maior subtileza.
Claro que, apesar da situação delicada de Kim, grande parte do impacto da história vem do caso AB-16. E é daqui que emerge outro dos grandes pontos fortes deste livro. É que, sem perder de vista o habitual ritmo intenso e de acção constante, os autores traçam um cenário complexo e que levanta várias perguntas relevantes. Os processos de radicalização, a forma como o preconceito pode ser usado em proveito próprio, até mesmo a forma como, a partir de uma série de suspeitas bem urdidas, se pode construir uma teoria completamente oposta à realidade dos factos, tudo isto está bem presente ao longo do enredo e a naturalidade com que tudo se desenrola só realça mais o impacto destas questões.
E depois, claro, há Jack e a forma como, a partir do seu carisma (e das suas discretas, mas perceptíveis vulnerabilidades), se gera uma série de simpatias e de aversões mais ou menos óbvias, que tanto proporcionam momentos de grande intensidade como de um muito agradável humor. Também isto torna a leitura mais cativante, pois vem criar picos de surpresa num livro onde a acção é praticamente incessante, acrescentando ao enredo uma faceta mais leve que, tendo em conta o cenário global, acaba por funcionar particularmente bem.
Trata-se, pois, muito provavelmente de um dos melhores livros desta série, um livro para devorar de uma assentada - e, depois, para ficar ansiosamente à espera da próxima aventura de Jack Morgan e da sua Private. Intenso, viciante e muito equilibrado na conjugação das suas múltiplas facetas. Muito bom, portanto.

Título: Private: Paris
Autores: James Patterson e Mark Sullivan
Origem: Aquisição pessoal

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Os 22 Mistérios da História (Geòrgia Costa)

Do Triângulo das Bermudas às Pirâmides de Gizé, passando, é claro, pelos avistamentos de discos voadores e pelas múltiplas previsões do fim do mundo, a História mundial está cheia de mistérios. E, sendo certo que alguns já foram desmistificados, outros continuam à espera de uma explicação convincente. Já ouviram falar destas histórias? Então de certeza que vão gostar de as relembrar. E quanto às que não ouviram... bem, há umas quantas surpresas à espera.
Pensado para um público jovem, mas muito interessante para leitores de todas as idades, este é um livro que cativa, acima de tudo, pela forma como consegue construir, para cada um dos tópicos, uma exposição simples e intrigante, realçando não só os aspectos mais misteriosos (e as inevitáveis teorias da conspiração), mas também as explicações que foram sendo obtidas ao longo do tempo. O resultado é uma percepção mais ampla, ainda que assente em explicações sucintas, tanto dos mitos, como da realidade subjacente.
Se o registo simples e cativante, associado, naturalmente, ao tema, bastam para despertar a curiosidade, há ainda um outro aspecto apelativo a salientar: o visual. Profusamente ilustrado e de uma forma que torna tudo mais perceptível, este é um livro em que um folhear superficial basta para chamar a atenção. E depois, quando se começa a ler, este apelo reflecte-se no texto, que, com a sua simplicidade, desperta curiosidade e vontade de saber mais.
Claro que, sendo as explicações tão breves, fica sempre um pouco insatisfeita a tal vontade de aprofundar mais o conhecimento. Mas a verdade é que não é esse o objectivo do livro. O que fica é uma visão geral do que se sabe sobre esses grandes mistérios - visão que, considerada como um todo, realça também a vastidão de coisas que não têm ainda explicação. Para o resto, haverá outras possibilidades a explorar. 
E assim a soma das partes é um livro leve e cativante em que para cada grande mistério surge uma explicação sucinta, mas também muito intrigante. Uma boa leitura para descobrir as estranhezas do mundo - para os mais novos e não só. 

Título: Os 22 Mistérios da História
Autora: Geòrgia Costa
Origem: Recebido para crítica

domingo, 10 de dezembro de 2017

Nenhuma Verdade se Escreve no Singular (Cláudia Cruz Santos)

Amália sempre se considerou uma mulher forte e essa convicção nunca deixou de se manifestar também na forma como aborda a sua profissão. Pelo seu tribunal, passam casos desesperados, situações que se descontrolaram, vidas inevitavelmente perdidas, de uma forma ou de outra. Mas, às certezas cada vez menores da sua vida profissional, juntam-se também as mudanças na vida pessoal. O homem que amava partiu sem grandes explicações. E Marta, a criança que decidiu acolher, pode necessitar da sua ajuda, mas aquilo por que mais anseia é voltar ao mundo que conhece e ao avô que, apesar de todos os problemas, é a sua âncora. Cada vez mais só nas complexidades da vida, Amália começa a questionar as suas certezas. Mas a verdade nunca é única nem absoluta. E cada resposta que julga encontrar traz apenas novas perguntas ao seu pensamento.
De ritmo relativamente pausado e com um enredo que se propaga em múltiplas direcções, este não é propriamente um livro de leitura compulsiva, já que tudo, desde as complexidades sentimentais ao entrelaçar dos factos mais difíceis, exige um certo tempo para absorver. Mas o mais interessante nesta leitura é que este registo mais lento, centrado em grande medida na introspecção, apesar de divagar para as vidas de diferentes personagens, nada retira ao impacto da história em si. Muito pelo contrário, aliás, pois a visão cada vez mais complexa que Amália tem da sua vida torna-se também cada vez mais verdadeira. A vida é complexa, afinal. Isso é inegável.
Também particularmente impressionante é que, embora grande parte da história seja vista do ponto de vista de Amália, há todo um cenário mais vasto a considerar. Dos casos que Amália julga no tribunal, bem como da história de Marta, de Madalena e da própria relação falhada de Amália, emergem questões muitíssimo pertinentes, como a importância da família biológica, a possível falibilidade do sistema jurídico ou a forma como o que se julga ser o melhor e o que realmente o é nem sempre são a mesma coisa. E esta complexidade surge não só da percepção de Amália, mas também dos comportamentos das personagens que a rodeiam. Marta, em particular, é um poço de complexidade: vulnerável, encantadora, mas obstinada nas suas vontades e capaz de atacar onde mais dói. Uma criança, mas com uma maturidade assustadora. Frágil, em certos aspectos, mas mais que capaz de se defender. 
E, claro, o fluxo da escrita parece ajustar-se perfeitamente a esta jornada de percepção. Pausada, introspectiva, divagando entre as diferentes facetas da narrativa, mas sem perder de vista a perspectiva global, dá a voz certa a cada figura e a cada momento, realçando, em cada situação, o que realmente importa. No fim, é certo que não há resposta para tudo - como na vida também as não há. Mas faz sentido a forma como tudo termina, num ponto de viragem que é apenas insinuado, mas que abre portas a toda uma nova fase da vida.
Nenhuma verdade se escreve no singular. É bem verdade esta afirmação. E é também esta a imagem que fica deste livro: a de uma caminhada por duras veredas em que a única verdade universal parece ser a da infinita complexidade do ser humano. Marcante, pertinente e com muito material em que pensar, um livro memorável em todos os aspectos. E que recomendo, naturalmente. 

Título: Nenhuma Verdade se Escreve no Singular
Autora: Cláudia Cruz Santos
Origem: Recebido para crítica

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

A Vida Louca dos Reis e Rainhas de Portugal (Orlando Leite, Raquel Oliveira e Sónia Trigueirão)

Das visitas a conventos com fins pouco religiosos às guerras sucessórias com razões mais ou menos plausíveis, passando pelos muitos casos de alcova, traições e tentativas de traição e extensas ou reduzidas descendências mais ou menos legítimas, a história de Portugal está cheia de casos peculiares. E, sendo embora uma história de séculos, há factores que parecem repetir-se num ciclo infinito: as dificuldades económicas, a vida amorosa não muito dada à monogamia e, principalmente, a rede de influências das diferentes classes em torno da mente e das acções dos soberanos. De todos os reis e rainhas há uma história para contar - e, de forma muito simples e sucinta, é isso mesmo que este livro faz.
Muito longe de ser um livro exaustivo nos aspectos da História que aborda, este é, ainda assim, um bom livro para quem quer saber um pouco mais sobre os aspectos mais pessoais da vida dos monarcas portugueses, pois, centrado nas histórias de amores e desamores, casamentos de conveniência e grandes paixões extra-conjugais, é sobre as facetas menos... regulares... de cada monarca que este livro mais se debruça. Ainda assim, não entra em grandes pormenores, centrando-se antes num traçado em linhas gerais do percurso de cada protagonista, incluindo os elementos mais importantes e também as peculiaridades.
Ora, reduzir um reinado a poucas páginas deixa inevitavelmente muito por contar e, assim sendo, este não será propriamente o livro certo para quem estiver à procura de pormenores. Para ficar a conhecer - ou relembrar - o básico, porém, esta será, sem dúvida, uma boa leitura, não só porque a informação fundamental está lá, mas também porque os aspectos invulgares tornam tudo mais cativante, despertando também a vontade de saber mais.
A impressão que fica é, portanto, a de uma forma simples e intrigante de descobrir um pouco da história dos vários monarcas portugueses - e, através deles, da evolução do reino ao longo dos tempos. Uma leitura simples e sintética, mas com muita informação interessante. E, por isso, um belo ponto de partida para o desvendar de uma história que, como se sabe, é sempre muito mais vasta. 

Título: A Vida Louca dos Reis e Rainhas de Portugal
Autores: Orlando Leite, Raquel Oliveira e Sónia Trigueirão
Origem: Recebido para crítica

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

O Corpo Humano para Montar

O conceito de aprender brincando é algo que nunca passa de moda - talvez porque torna a aprendizagem muito mais divertida. E que melhor maneira de começar a aprender os elementos básicos do corpo humano senão com um livro colorido que não só explica as bases de forma simples como permite construir um modelo onde tudo isso se pode ver? Bem, é esta experiência que este pequeno livro proporciona. E o resultado é bastante interessante.
Claro que se olharmos para um livro destes enquanto adultos, tudo parece muito, muito simples, talvez até demasiado. Mas, se nos lembrarmos de como foi aprender as primeiras coisas sobre o corpo humano, já não é bem assim, pois não? Além disso, não é que este livro pretenda servir como transmissor de uma grande dose de conhecimento. O que ensina são as coisas simples, o princípio de um conhecimento que mais tarde se expandirá. E, para os mais pequenos, que começam agora a aprender as coisas, então este modelo simples e interactivo é uma muito boa forma de aprender os primeiros aspectos - e de despertar a curiosidade de saber mais.
Claro que, sendo um livro para os mais novos, a acessibilidade é essencial, não só no conteúdo, como na construção do modelo em si. E esse é outro ponto positivo. Além do visual apelativo que chama a atenção e facilita a memorização do conhecimento, também o modelo é muito fácil de montar, proporcionando assim uma experiência didáctica e divertida aos potenciais jovens leitores deste livro. 
É, de facto, muito simples e principalmente um ponto de partida. Será, por isso, acima de tudo, um livro para aqueles que começam a aprender, pois para um conhecimento mais pormenorizado haverá decerto livros mais adequados. Mas, para os mais pequeninos? Bem, é uma bela forma de começar a descobrir o corpo humano. E é assim que se começa a querer saber mais. 

Título: O Corpo Humano para Montar
Autor: Vários
Origem: Recebido para crítica

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Bougainvillea (Antonio Orlando Nomeriano)

Joell deixou à mãe um jardim esplendoroso e depois desapareceu. Mas Gille não se conforma com a ausência do filho e, por isso, decide contratar um detective para que descubra o que realmente aconteceu. A verdade, sabe, está escondida algures no passado. Mas um passado que escondeu grandes segredos e abalou a mais forte das amizades não pode senão trazer consequências terríveis. E, quando descoberta, a verdade poderá ser difícil de aceitar...
Muito breve, apesar de abranger um período relativamente vasto, este é um livro que deixa sentimentos ambíguos. Por um lado, o potencial da história é evidente e a revelação final tem tudo para ser um momento de grande impacto. Por outro, a narrativa demasiado sucinta em contraponto com algumas longas - e não muito necessárias - explicações, principalmente no que diz respeito à jardinagem, torna o ritmo do enredo um pouco errático. Além disso, também a escrita um pouco confusa, com divagações pelo passado, contribui para essa sensação geral.
O que se destaca, então? Bem, acima de tudo, o potencial de uma história que podia ter sido muito mais vasta, já que, quer o mistério em si, quer a sua surpreendente resolução, quer ainda as relações passadas entre as várias personagens têm muito de interessante e que poderia ter sido muito mais desenvolvido. Há bons momentos? Há, com certeza. E é precisamente por isso que fica o tal sentimento de que haveria muito mais para contar.
Mas é principalmente a escrita que deixa esta sensação de ambiguidade, a oscilação entre momentos em que tudo acontece demasiado depressa, onde actos e explicações parecem ficar sem grandes consequências, enquanto noutros momentos a explicação se alonga em aspectos de menor importância. Além disso, parece haver também alguma irregularidade na estrutura do texto, já que nalguns dos diálogos não se percebe muito bem quem está a falar. Tudo isto acaba por contribuir para a sensação de confusão geral e de que, com um pouco mais de coesão, a intensidade da história - que tem, de facto, muito potencial - poderia ter sido muito mais amplificada.
Tudo somado, a impressão que fica é a de um livro breve e agradável quanto baste, mas que poderia ter sido muito mais. No seu grande mistério e nos muitos segredos que a ele conduziram há todo o potencial de uma grande história. Pena que tenha acabado por ficar tão curta.

Título: Bougainvillea
Autor: Antonio Orlando Nomeriano
Origem: Recebido para crítica

domingo, 3 de dezembro de 2017

Como Parar o Tempo (Matt Haig)

Tom Hazard tem o aspecto de um homem de quarenta anos - mas, na verdade, a sua idade conta-se em séculos. E, no decurso da sua longa vida, amou, perdeu, sofreu injustiças, teve vontade de morrer... e sobreviveu. Pelo caminho, conheceu alguns famosos do passado, foi recrutado (até porque não tinha escolha) para uma misteriosa sociedade e nunca mais voltou a permitir-se sentir por ninguém. Mas agora Tom sabe que não pode continuar assim e sente que precisa de voltar ao lugar onde tudo começou. De novo em Londres, como professor de história, Tom revisita as memórias de um passado demasiado longo, ao mesmo tempo que um sentimento indesejado - mas não desagradável - começa a nascer. Mas quem entra na sociedade não volta a sair com vida. E o seu estranho mentor está atento ao comportamento de Tom. 
Impressionante desde as primeiras frases e até ao fim, este é um livro em que todos os aspectos são fascinantes, mas em que, inevitavelmente, o primeiro a sobressair é a escrita. Matt Haig formula pensamentos com uma mestria tal que, de início, é inevitável a vontade de começar a tomar notas das citações. (E depois já são tantas as citações notáveis que o mais provável seria tomar nota do livro inteiro.) Há tanta beleza nas palavras, tanta naturalidade na forma como tudo flui e, principalmente, uma sensação tão forte de que tudo se exprime da forma ideal, que é irresistível o apelo de esquecer o mundo, parar o tempo e mergulhar na leitura sem interrupções.
E a escrita é apenas o início, pois personagens e enredo são também igualmente marcantes. O enredo, porque há na história de Tom ao longo dos séculos - e principalmente no presente - todo um percurso de aventuras e de perigos e perdas e descobertas e cada momento é intenso e cativante. As personagens, porque ninguém é perfeito, mas todos são perfeitamente construídos. E Tom... Bem, Tom é um protagonista fascinante, profundamente humano na sua diferença, capaz de sentimentos imensos e de ainda maiores vulnerabilidades, consciente e crédulo consoante os fluxos da vida.
O que me leva ao que é, para mim, o verdadeiro pináculo desta leitura: a emoção. Durante a sua longa vida, Tom lidou com todo o tipo de situações e pessoas e esse percurso está, naturalmente, pejado de emoções intensas. Mas a forma como estas emoções se manifestam, tanto em pensamentos certeiros como em momentos pura e simplesmente devastadores, nunca deixa de surpreender e de marcar. E mais. Há em todo este longo percurso tantas raízes de empatia que compreender Tom faz-nos sentir também um pouco compreendidos. E isso... bem, isso é uma magia especial.
Que mais se pode pedir a um livro? Por toda a beleza das palavras, bem como pela emoção e proximidade que história e personagens despertam e pela sempre fascinante aventura da longa vida de Tom Hazard, a verdade é que, no fim, fica-se de coração cheio. Magia - é isso que se encontra nas páginas de uma boa leitura. E este livro é, de facto, pura magia. Maravilhoso. 

Título: Como Parar o Tempo
Autor: Matt Haig
Origem: Recebido para crítica

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Consciência (Charlie S. Dias)

Desde pequenos que Derick, a irmã e a amiga River são amigos inseparáveis. Mas uma separação forçada leva-os a novos pensamentos e à descoberta de novas relações. Os irmãos parecem fechar-se em si mesmos, enquanto River encontra no mundo digital o refúgio de que precisa. E quando o tempo passa  e o reencontro finalmente surge, nenhum deles é já o mesmo e uma nova amizade - que aspira a ser algo mais - intromete-se na tranquilidade do trio. O afecto torna-se amor não correspondido, e esse transforma-se em mágoa. E, no momento em que a vida se torna demasiado pesada, só uma estranha peregrinação poderá lançar sobre a vida uma nova luz.
Relativamente breve, e porém abrangendo um vasto período de tempo, uma das primeiras impressões que este livro desperta é a de que facilmente se poderia ter expandido para uma história muito maior. As relações entre os protagonistas, a forma como lidam com a separação, a própria viagem de Derick na fase mais avançada do enredo... tudo isto poderia ter sido muito mais elaborado. Assim sendo, é inevitável uma certa sensação de curiosidade insatisfeita. Mas há também uma contrapartida. É que, pese embora o que fica por contar, o essencial está lá - e esse é mais do que suficiente para cativar. 
Sendo que grande parte da história se centra na relação entre os três amigos, bem como na descoberta de novas relações, pode dizer-se que esta é, acima de tudo, uma jornada de crescimento. E é neste aspecto que surge o lado mais interessante deste pequeno livro: o facto de, apesar da brevidade, ser perfeitamente possível reconhecer os pontos essenciais deste percurso. Os factores que abalam uma amizade, a descoberta de relações mais profundas, a chegada à vida adulta e a sensação de não se estar preparado... tudo isto surge, de certo modo, ao longo da história. E, simpatize-se ou não com a posição das personagens, é fácil reconhecer pontos em comum com a realidade. 
Se o aspecto emocional é fácil de assimilar, já ao nível dos acontecimentos nem sempre é fácil acompanhar o passo das personagens. Talvez também devido à brevidade, há aspectos que parecem ser um pouco confusos, sobretudo na fase inicial. Após a entrada em cena de Consciência, contudo, a história parece fluir com mais naturalidade e, em consequência, o ritmo torna-se bastante mais envolvente.
No fim, a impressão que fica é a de uma viagem por vezes atribulada, mas sempre cativante e com uma visão muito interessante da jornada em direcção à idade adulta. Haveria mais para contar? Certamente. Mas o essencial está lá... e isso basta. Gostei. 

Título: Consciência
Autor: Charlie S. Dias
Origem: Recebido para crítica