segunda-feira, 19 de setembro de 2016

A Espia (Paulo Coelho)

Acusada com provas duvidosas e condenada à morte, Mata Hari usa os seus últimos dias de vida para contar a sua história. Fá-lo numa carta-testamento ao seu advogado e, nas suas palavras, percorre as memórias de toda uma vida. Alguns chamaram-lhe devassa, prostituta, mas não hesitaram em relacionar-se com ela, virando-lhe depois as costas quando as coisas se complicaram. Outros, admiraram-lhe a arte, amaram-na até. Mas poucos saberiam, antes do fim, de onde viera aquela mulher excêntrica e sedutora, capaz de despertar tanto fascínio como inimizade. Esta é a sua história.
Relativamente breve e contado na primeira pessoa, primeiro pela voz de Mata Hari, e depois pela do seu advogado, esta é uma história em que os factos podem ter a sua importância, mas parecem ser as emoções e os pensamentos a dominar. Os da protagonista, claro, que, incapaz de suportar o tédio do lugar onde nasceu, se transforma na mulher fatal cujo nome, por ela escolhido, viria a ficar gravado na história. E o que o autor faz neste livro é, acima de tudo, dar voz a estas ânsias e pensamentos, à força que move a protagonista através de uma vida tão cheia de tribulações.
Ao deixar os acontecimentos para um relativo segundo plano, o autor consegue duas coisas: realçar o impacto das emoções de uma mulher que conta a sua história na possível iminência da morte, o que confere uma maior intensidade à narrativa, e conferir uma perspectiva mais pessoal aos acontecimentos que efectivamente são desenvolvidos. Mas há, porém, um outro lado a considerar: esta relativa brevidade faz com que o contexto global surge de uma forma algo vaga e em que certos acontecimentos são contados de forma algo apressada. Ora, isto acaba por criar uma certa distância, pois o impacto das coisas vividas é deixado por explorar. 
O essencial está lá, contudo. É perfeitamente possível compreender, a partir da forma como o autor constrói a história da sua protagonista, a intensidade de uma vida que, ao mesmo tempo, parece procurar e recusar o amor, ao mesmo tempo que assume como indispensável uma liberdade pouco característica da época em que tudo acontece. E isso não pode deixar de cativar, principalmente tendo em conta o ponto de vista a partir do qual a história é contada. 
Bastante breve e relativamente simples, trata-se, pois, de um livro que deixa algumas perguntas sem resposta. Mas que, na sua forma sucinta, mas fluída e envolvente, permite ficar com uma imagem bem precisa da mulher a quem muitos chamaram espia, num caso que as provas existentes parecem  querer desmentir. Uma história interessante, portanto, e uma boa leitura. 

Título: A Espia
Autor: Paulo Coelho
Origem: Recebido para crítica

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