domingo, 16 de fevereiro de 2014

Wasteband (Patrícia Portela)

Definida como uma experiência de virtualidade em que o produto oferecido tem a ver com a espera e o tempo perdido, a Wasteband, projecto de um conjunto de cientistas/alquimistas em plena era da exploração espacial é, no fundo, um espaço de momentos e de percepções partilhadas. E dessa experiência virtual se constrói esta estranha história, em que figuras se cruzam num real improvável, enquanto o leitor segue passos e fragmentos, como que experimentando as componentes do programa. Um mundo pouco possível e um núcleo de elementos divergentes dão forma, pois, a uma viagem através da espera. E é dessa viagem que se define este livro.
Se fosse preciso definir este livro numa única palavra, essa seria, sem dúvida, peculiar. Porque é, no fundo, essa palavra que define todos os aspectos deste livro, desde a estrutura à ideia que lhe serve de base, passando pelo ritmo da escrita e pelas interacções entre as figuras que povoam a história. Tudo é estranheza neste livro. Entre os conceitos improváveis, a base construída para explicar o sistema Wasteband e a simples associação de ideias que leva o leitor a percorrer os diferentes níveis, nada é exactamente aquilo que se espera. E, por isso mesmo, tudo é uma surpresa.
Dito isto, é precisamente esta unicidade que torna esta leitura tão interessante. É que todos os muitos elementos que se conjugam para dar forma à narrativa confluem para um equilíbrio muito delicado, que mantém sempre viva a curiosidade em saber mais. Nada do que é contado parece provável, mas a forma como todo o universo é construído confere-lhe a aparência de algo quase simples.E, assim sendo, apesar de toda a ciência desenvolvida para explicar o sistema, de todos os elos que se confundem e misturam na mais improvável das formas, é fácil ocupar o papel do leitor que entra no sistema Wasteband. Tudo é estranho, mas tudo é familiar, e essa impressão é algo de fascinante.
E, de toda esta diferença, de todas as peculiaridades, sobressai ainda algo de universal. É que, por entre os meandros complexos da Wasteband, dois conceitos se destacam. O primeiro é o da espera, de tudo o que esperamos ao longo da vida. O segundo é o amor, personificado nas duas figuras que, surgidas não se sabe bem de onde, assumem o papel de quase protagonistas de toda esta história. Na verdade, estes dois elementos funcionam como ligações à realidade, contribuindo em muito para tornar real a virtualidade do mundo da Wasteband. Também essa ligação acaba por ser um aspecto especialmente interessante.
O que define, pois, este livro é tanto o que torna estranho como o que o aproxima do real. Peculiar, inesperado, mas fascinante, a impressão que passa é, primeiro de estranheza, mas cedo se torna envolvente, com todas as suas surpresas. Vale, pois, muito a pena ler este Wasteband. Muito bom.

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