quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Padeira de Aljubarrota (Maria João Lopo de Carvalho)

Brites de Almeida nasceu sob auspícios nefastos. Figura de parca beleza, muitos a tomam por obra demoníaca, apenas pelo mal destinada a caminhar pelo mundo. Mas, guiada por uma história com um tempo definido, Brites sabe-se diferente e, na diferença, quer ser o melhor que puder. O seu caminho leva-a a acções pouco avisadas, a múltiplas provações e a culpas que terá que carregar. Mas, num reino em mudança, em que tantos interesses se confundem e amores e lealdades se erguem acima da preservação do reino, haverá também um papel destinado a Brites, chamada a Dama Pé de Cabra, donzela guerreira e mulher forte, apesar de todas as tribulações.
Escrito em capítulos relativamente curtos e com um ritmo sempre envolvente, este livro surpreende, em primeiro lugar, pelo facto de, apesar de ter como protagonista a dita Padeira de Aljubarrota, que dá nome ao livro, haver também um conjunto de outros protagonistas que, em relação com Brites, ou na evolução da história global do reino, acabam por ser igualmente relevantes. Na verdade, a história divide-se entre o percurso de Brites e o dessas outras personagens, dando forma a um conjunto que, por ser mais vasto, se torna também sempre mais interessante.
Um outro aspecto que sobressai, relativamente a estas várias personagens, é uma certa ambiguidade moral, já que várias destas figuras, e entre elas a própria Brites, tanto são capazes de gestos de pura generosidade como de acções que dificilmente podem ser vistas como inocentes. Assim, a história é feita tanto do que gera empatia como do que a afasta, revelando as variações do comportamento consoante a dificuldade das circunstâncias. Claro que, para algumas das personagens, o lado bom supera as transgressões, enquanto que, noutros casos, é o contrário que sucede.
Nesta perspectiva, importa ainda mencionar o equilíbrio entre o percurso pessoal das personagens e o contexto histórico global, com a história dos protagonistas a relacionar-se intimamente com as mudanças operadas no reino com os conflitos vigentes e, depois, com a chegada ao poder do Mestre de Avis, num retrato que é também uma perspectiva geral sobre as mudanças operadas sobre o reino, mas, principalmente, a história de uma figura central e de um conjunto de personagens complementares.
O que define este livro é, por isso, tanto o percurso das personagens, entre tribulações, sucessos, tragédias e um toque de magia, como o momento da História em que se movem. Tudo isto numa história envolvente, rica em momentos marcantes e com um ritmo que torna difícil abandonar a leitura. Recomendo, pois.

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