quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Obliterados (Alexandre Ferrony)

1101 é um rapaz diferente numa cidade invulgar, onde, por sistema, a indiferença reina e ninguém alimenta aspirações, sentimentos ou qualquer reacção a comportamentos invulgares. Ali, todos se movem de acordo com o convencionado e se alguém diferente, como 1101, surge, qualquer comportamento fora das normas é simplesmente ignorado. Mas ele não é o único e, no momento em que conhece Cór pela primeira vez, 1101 sabe que tem se manter livre e capaz de pensar, pois é a única forma de mudar a cidade. Mas que pode um só indivíduo contra todo o sistema?
O que este livro tem de mais interessante é a ideia que lhe serve de base. A ideia de uma cidade, resultado da experiência de alguns homens e moldada ao pormenor para ser um sistema isolado em que todos vivem sob as normas implementadas porque não conhecem qualquer alternativa, apresenta um contexto com muito potencial e que, nos melhores momentos do enredo, consegue ser bem explorado. Detalhes como a ligação de Cór, orientador do protagonista, ao líder da cidade, a designação por números em vez de nomes e momentos como a reacção global quando 1101 tenta explicar a todos o que está a acontecer, dão forma a alguns dos melhores momentos da história.
Há, contudo, algumas fragilidades que dificultam a leitura. Narrada pela voz do protagonista e em capítulos relativamente curtos, a história da cidade perde destaque relativamente às longas deambulações de 1101, algumas delas inconsequentes e apresentadas com uns quantos pormenores algo repugnantes. Além disso, ficam demasiadas perguntas sem resposta, quer devido ao afastamento de 1101 da cidade - ficando em aberto tudo o que acontece depois da sua partida - , quer devido a alguns comportamentos inexplicáveis das personagens, que, ora parecem ter toda a vontade de causar a mudança, ora parecem mergulhar numa apatia sem sentido. Falta também uma revisão mais cuidada ao texto, já que também as gralhas relativamente frequentes e algumas frases bastante estranhas dificultam também o ritmo da leitura.
Ficam, por tudo isto, sentimentos ambíguos. O conceito essencial é bastante interessante e há, inclusive, vários momentos bem conseguidos (sendo de destacar aqueles em que 1101 fala às gentes da cidade), mas a concretização acaba por ser algo confusa, ficando aquém das expectativas. O que é pena, porque esta poderia ter sido uma história bastante mais rica, se houvesse um maior desenvolvimento do sistema e menos das deambulações do protagonista.

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