segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Estações Diferentes (Stephen King)

"O importante é a história, não quem a conta", escreve o autor numa das quatro novelas que constituem este livro. E, contudo, é fácil reconhecer o que de melhor existe na escrita do autor em cada uma das obras. Ambientes diferentes, temas diversos, mas igualmente complexos, uma narrativa envolvente, com algumas surpresas e bons temas para reflectir... tudo isto se encontra em cada uma destas novelas, e é isso que faz de Estações Diferentes uma leitura impressionante. Mas vamos por partes.
Os Condenados de Shawshank apresenta a história de um inocente condenado por homicídio, da sua vida na prisão e dos seus planos para a liberdade, numa narrativa intensa, cativante e muitíssimo bem escrita. As personagens são fascinantes, destacando-se a construção de uma personalidade para um protagonista situado algures entre a lenda e a simples realidade humana, bem como para a figura do próprio narrador. Impressionam, também, o tom e a intensidade com que as rotinas e incidentes da vida prisional são apresentadas, percorrendo um amplo espectro de emoções, que vão do enternecedor ao revoltante. Um retrato directo e sem rodeios de um sistema onde o interesse prospera, a brutalidade é simplesmente normal e até a inocência pode ser sacrificada para bem do interesse dos mais fortes, esta novela é também uma lição de persistência que culmina num final poderosíssimo. Magnífico, em todos os aspectos.
Segue-se Aluno Dotado, história de um rapaz que convence um velho aparentemente inofensivo a reviver as suas memórias das atrocidades nazis... com graves consequências para ambos. Com um par de protagonistas feitos de personalidades perturbadoras, há tanto de arrepiante na caracterização dos protagonistas como na descrição dos horrores narrados pelo velho. É interessante o equilíbrio que se estabelece entre o rapaz e o velho, criando uma tensão progressivamente mais intensa à medida que novas estratégias são necessárias para preservar o controlo mútuo, e também curiosa é a pequena ligação entre esta história e a anterior. Há ainda uma interessante evolução a nível de emoção, de uma quase decadência que apela à empatia, numa progressiva transição para o asco proporcionado por momentos de uma crueldade quase revoltante. Por último, importa mencionar a forma surpreendente como a memória influencia a realidade, tornando-se cada vez mais sinistro o rumo de acontecimentos que culminam num final inesperado e algo macabro.
Em O Corpo, quatro rapazes embarcam numa viagem para ver um cadáver, descobrindo, ao longo da sua aventura, muito a respeito da sua própria natureza. Mais uma história intensa, de ritmo cativante, em que, mais que a própria caminhada até ao corpo - e ainda que os acontecimentos desta sejam muitíssimo interessantes - , é no crescimento e na história familiar de cada um dos rapazes que reside a maior força. Também os contos atribuídos ao protagonista estão muito bem conseguidos, mas, neste conto intenso e com alguns momentos de macabro, destaca-se principalmente a reflexão sobre a forma como cada um é influenciado pelos que o rodeiam. Uma história marcante, em suma, sobre a amizade, o crescimento e a perda da inocência.
A Técnica de Respiração tem como ponto de partida uma noite de mau tempo e uma história contada num misterioso clube de cavalheiros. Muitíssimo interessante a nível da caracterização do clube, bem como da estranheza com que o narrador o terá conhecido pela primeira vez, apresenta também uma boa reflexão sobre o valor de uma boa história, independentemente de quem seja o seu autor. Quanto à história propriamente dita - a contada no clube - marca pelo mistério, pelo tom como o narrador a apresenta e pelo final surpreendente. Mais uma vez, destaca-se o retrato da sociedade marcada pelos preconceitos. Trágica e algo mórbida, esta história é, apesar disso, estranhamente bela na sua abordagem ao espírito de sacrifício. Impressionante.
Ainda a referir um muito interessante Posfácio, que, de forma descontraída, cativante e algo pessoal, deixa o leitor a reflectir sobre temas tão diversos como o preconceito para com alguns géneros literários, a ambiguidade comercial da novela, o valor da literatura de entretenimento e a paixão que um autor tem pela sua obra, mesmo quando se desvia do mais desejado pelos críticos ou pelo público leitor.
Feito de histórias complexas, mas cativantes, com elementos de horror, mas não se limitando a isto, Estações Diferentes é, em todos os aspectos, uma leitura impressionante. Bem escrito, com tanto de intensidade como de emoção e juntando ainda uma boa medida de assuntos para reflectir, um livro que recomendo sem reservas.

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