segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

D. Dinis, a quem chamaram O Lavrador (Cristina Torrão)

Desde a infância até aos seus últimos dias, o percurso de um monarca que, ao longo dos quarenta e seis anos do seu reinado, mudou consideravelmente a situação do poder régio português, num romance que, para além dos seus passos mais conhecidos e das suas mais relevantes decisões, apresenta o retrato de D. Dinis no seu mais humano, com os seus conflitos, as suas dúvidas e as suas predilecções.
É na criação de um lado humano e na exploração das ligações mais pessoais de D. Dinis que Cristina Torrão cria os momentos mais altos deste livro. Se o ritmo dos acontecimentos é, de forma geral, envolvente, são os momentos de maior tensão e as situações mais dramáticas que conferem a esta leitura a sua grande força. Como não poderia deixar de ser, momentos há em que a listagem de nomes associados a certos acontecimentos é vasta e, em consequência dessas mesmas situações, não se pode dizer que se trate de um livro de leitura compulsiva. Mas a conjugação desses momentos mais distantes (porque mais associados à globalidade do reino e menos à figura pessoal do soberano), com os poderosos picos de emoção provocados por situações como o encontro final entre Dinis e o seu irmão e, principalmente, o belíssimo capítulo final deste livro fazem com que a leitura nunca se torne maçadora, já que a vastidão de elementos históricos que têm imperiosamente de ser apresentados não quebra a envolvência da história do rei enquanto, simplesmente, Dinis.
Um outro aspecto que muito cativou foi a apresentação dos intervenientes nesta história de uma forma onde nenhum dos lados tem a razão absoluta. Em várias circunstâncias, mas principalmente na relação conflituosa entre Dinis e a sua rainha, o leitor é levado a sentir mais empatia ora com um, ora com o outro, mas sem que fique, alguma vez, a sensação de algum deles estar absolutamente certo. E também este aspecto confere realismo a este romance.
Ainda uma última referência à forma como a autora explora o poder dos rumores e das mudanças que estes sofrem à medida que se propagam. Quer no sobejamente conhecido milagre das rosas, quer nas acusações trocadas entre Dinis e o seu filho, o poder do rumor acaba por se revelar quando situações absolutamente falsas acabam por se tornar certezas globais.
Uma leitura interessante, com muitíssimo a ensinar sobre a história de D. Dinis (e, consequentemente, do Portugal do seu reinado), mas também, e principalmente, uma história envolvente sobre um jovem que, para ser soberano, acaba por afastar de si parte do que significa ser simplesmente homem.

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